PIF – Tudo que você precisa saber

A Peritonite infecciosa dos felinos, conhecida por PIF, sempre foi uma das doenças mais frustrantes dentro da medicina felina. Não só pelo prognostico ruim, já que até pouco tempo não tínhamos nenhuma esperança de tratamento curativo, mas também pelo seu diagnostico complexo. Até hoje não existe nenhum método diagnostico simples e não invasivo para confirmação da doença.

Para entender a dificuldade em realizar o diagnóstico é necessário entender como o animal desenvolve a enfermidade.

A PIF é causada por um coronavírus. Mas é extremamente importante entender que nem todo coronavírus causa PIF. Existem diversos tipos de coronavírus no mundo, que acometem espécies diferentes e causam doenças diferentes.

De forma didática, o gato pode ter o coronavírus entérico (FCoV) – vírus de fácil transmissibilidade que pode causar leve diarreia transitória ou ser assintomático. Até 80% da população mundial de gatos são portadores deste coronavírus entérico (FCoV) que não causa problemas graves na saúde dos gatos.

E temos o coronavírus da PIF (FIPV), que causa a devastadora doença que leva os gatos a óbito em curto espaço de tempo se não tratado e que não tem potencial transmissível.

O coronavírus da PIF é o coronavírus entérico que sofreu mutações especificas dentro de um gato suscetível (geneticamente e imunologicamente). De 1 a 10% dos gatos que tem o coronavírus entérico, por questões individuais, vão desenvolver a PIF. Porém, é necessário entender que não existe nenhum exame específico capaz de diferenciar essas duas formas do vírus. Tanto a sorologia (ELISA) quanto o PCR são capazes de detectar apenas se o gato teve contato com o vírus. Sem nos dizer se ele está na sua forma inofensiva ou não.

Portanto, exames sorológicos, mesmo quando apresentam altos títulos de anticorpos não devem ser levados em consideração na hora do diagnóstico da PIF. Esses anticorpos são produzidos tanto para FCoV quanto para FIPV e o exame não é capaz da diferenciação. Além disso, 10% dos gatos com PIF apresentam sorologia negativa (falso negativo). A sorologia tem indicação de ser feita para uso preventivo contra o coronavírus entérico em situações especificas. E não para uso diagnostico.

O PCR é um exame onde se detecta material genético do vírus. Tanto o coronavírus entérico quanto o coronavírus da PIF podem estar em circulação no sangue. E esse exame quando positivo também não é capaz de diferenciar as duas formas virais. Portanto, mais uma vez, o exame só serve para saber que o gato teve contato com um coronavírus, mas não se ele causou PIF. O PCR do sangue também não serve para descartar a presença da doença já que a baixa sensibilidade do teste causa uma maioria de resultados falsos negativos (negativo por não conseguir detectar o vírus, apesar de estar presente). O PCR será útil no diagnóstico quando avaliado da efusão (em caso de PIF úmida) e do líquor (quando existe acometimento neurológico), mas nunca quando avaliado do sangue.

Com isso, não existe nenhum resultado em exame de sangue que irá confirmar o diagnóstico pela presença do vírus. O único exame capaz de confirmar a doença é a imuno-histoquímica, pois detecta o vírus em um tecido doente (onde o FCoV não está presente em situações normais). Porém, esse exame necessita que um tecido acometido seja enviado para análise, por meio de biopsia. Como pacientes doentes são imunossuprimidos e debilitados, não é indicado submetê-los a anestesia e cirurgia para coleta de material.

Então, como é possível realizar o diagnóstico?

É necessário que o veterinário tenha experiência com a doença porque muitas vezes o diagnóstico se faz extremamente desafiador.

Precisa-se juntar várias informações que podem ser compatíveis com PIF para que a suspeita fique mais clara. É como se cada alteração compatível com PIF no histórico, nos sintomas e nos exames (hemograma, bioquímicos, análise de líquido cavitários e ultrassom) valesse um ponto. Quanto mais pontos, maior a probabilidade do diagnóstico de PIF.

Portanto, será avaliado:

  • a idade do animal (geralmente menor que 2 anos)

  • a procedência (maior chance em animais advindos de gatis e locais de alta densidade populacional)

  • histórico de estresse (mudança, animal novo na família, castração, vacinação, doença viral concomitante...)

  • sintomas de apatia

  • falta de apetite

  • febre

  • inflamação ocular

  • por vezes alterações neurológicas

  • efusões (acumulo de liquido em cavidades)

  • hemograma pode apresentar linfopenia (número de linfócitos abaixo da referência)

  • presença de anemia leve a moderada

  • valor de proteína total aumentada à custa de albumina diminuída e globulina aumentada, com relação entre albumina e globulina menor do que 0,8 (sendo que se menor que 0,4, maior probabilidade de PIF)

  • hiperbilirrubinemia (que é quando o gato apresenta o soro, pele e/ou mucosas amareladas)

  • no exame de imagem pode ser encontrado liquido livre (onde se faz necessário mandar para análise e avaliar se suas características são condizentes com PIF)

  • além de no ultrassom abdominal haver imagens que podem ser compatíveis com granulomas (espessamentos; semelhante a nódulos) em qualquer órgão, linfonodos aumentados significativamente, e por vezes, rins aumentados.

Assim, exames como sorologia e PCR do sangue devem ser solicitados e avaliados com extrema cautela, sendo que a maioria dos pesquisadores desaconselham a realização, por trazerem mais confusão do que benefício na busca do diagnóstico. Lembrando que nenhum outro achado isoladamente fecha o diagnóstico (nem mesmo a relação albumina e globulina). Cada caso deve ser avaliado cuidadosamente como um todo na busca da melhor abordagem ao paciente.

Atualmente, já existe tratamento eficaz para PIF, com comprovação científica, embora por questões burocráticas da empresa farmacêutica responsável o medicamento ainda não tenha sido liberado para uso na medicina veterinária.  Mesmo assim, alguns tutores já conseguem importar a medicação de alto custo e tratam seus felinos. Os primeiros gatos tratados no Brasil, em 2020, seguem curados e saudáveis até hoje.

Anterior
Anterior

FeLV